R$ 156 milhões poderiam ser economizados no SUS com universalização do saneamento; 90% da população não tem acesso e residem em áreas vulneráveis
Nesta terça-feira (27 de abril) o Instituto Trata Brasil lançou o estudo ?Benefícios Sociais e Econômicos da Expansão do Saneamento Básico no Estado do Acre?. Em um momento em que o mundo encara a pior pandemia da história, com números assustadores de internações e óbitos, principalmente no Brasil, a ausência de saneamento básico se torna ainda mais relevante. Dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), ano 2019, mostram que em plena pandemia o país ainda possui 35 milhões de pessoas sem acesso à rede de água potável e mais de 100 milhões sem coleta dos esgotos. Somente 49% dos esgotos gerados no país são tratados, o que equivale a jogar todos os dias na natureza uma média de 5,3 mil piscinas olímpicas de esgotos sem tratamento. Com a aprovação do novo Marco Legal do Saneamento (Lei Federal 14.026/2020) o cenário precisa mudar, pois Estados e municípios ficam com a obrigação de fornecer água potável para 99% da população e coleta e tratamento dos esgotos para 90% até 2033.
O cenário do Estado do Acre
Desde 2007, o Instituto Trata Brasil avalia as situações regionais do saneamento básico para compreender os desafios e possíveis ganhos que estados e municípios teriam com a universalização do saneamento, sobretudo ganhos na saúde pública, com a redução de doenças, mas também na educação, no trabalho e renda, geração de empregos, melhorias no valor dos imóveis e no turismo.
Capital Rio Branco e suas deficiências sanitárias: o Trata Brasil há 11 anos publica seu Ranking do Saneamento, com base nos indicadores das 100 maiores cidades, e Rio Branco há muitos anos figura entre as piores cidades. No relatório 2021 (ano base 2019), a capital estava na 92ª posição entre as 100 cidades. Isso evidencia que tanto o estado quanto a capital têm desafios enormes em saneamento básico e estão muito distantes das metas previstas no novo Marco Legal do Saneamento.
Como parte destas análises regionais, este estudo se propôs a analisar os ganhos que a universalização do saneamento traria ao Estado do Acre e suas maiores cidades. Embora não se tenha um estudo definitivo sobre a ligação entre a falta de saneamento básico com o aumento de casos de Covid-19, é muito provável que a escassez de serviços de saneamento do Acre dificulta o combate à doença causada por esse vírus. Apenas 48% da população tem acesso à água potável e somente 10% dos acreanos têm o esgoto coletado. Vale ressaltar que a pandemia avança também nesse estado, com quase 74 mil pessoas infectadas e 1.400 mortos (abril 2021 – https://agencia.ac.gov.br/wp-content/uploads/2021/04/BOLETIM_AC_COVID_12-04-2021.pdf ).
Além do baixo acesso aos serviços, o Acre é um dos estados que mais perde água potável nos sistemas de distribuição devido aos vazamentos, furtos e erros de leitura dos hidrômetros, com indicador apontando 60% de perdas, uma ineficiência muito acima da média do Brasil, que é de 39%.
Estudo ?Benefícios Sociais e Econômicos da Expansão do Saneamento Básico no Estado do Acre? e principais resultados:
Desenvolvido pelo Trata Brasil em parceria com a EX Ante Consultoria Econômica, o estudo contempla uma análise histórica, entre 2005 e 2019, e as projeções de ganhos que o saneamento traria entre 2021 e 2040, prazo das metas do novo Marco Legal do Saneamento, e num futuro até 2055. A metodologia do estudo pode ser vista no site teste.tratabrasil.org.br . O material conta com o Apoio Institucional do Ministério Público Federal do Estado do Acre; Ministério Público do Acre; e Ministério Público de Contas.
– Como primeiro desafio apontado no estudo, para chegar às metas o Estado do Acre precisa ampliar seus investimentos para um valor médio de R$ 41,1 milhões por ano, resultando num aporte de R$ 1,439 bilhão em 35 anos (2021-2055) em valores correntes, valor também apontado publicamente em estudo feito pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento) em 2019. Desse montante, R$ 1,361 bilhão deverá ser desembolsado nos primeiros 20 anos, o que representa um esforço anual de R$ 68,1 milhões por ano em duas décadas. Esse valor é muito superior ao que o estado do Acre conseguiu investir em 2019: R$ 21,3 milhões.
No período de 2005 a 2019, os investimentos em saneamento do estado do Acre alcançaram o valor médio anual de R$ 34 milhões. Vale mencionar que, nesse período, o governo do estado contava com aportes de transferência do governo federal para financiar os investimentos, algo que ficou bastante limitado nos últimos anos em razão da crise fiscal.
– Os ganhos com a universalização dos serviços de água e esgotos, seja na geração de empregos devido aos investimentos e na operação dos serviços, mas também com a redução de doenças, melhoria na educação, valorização imobiliária e ganhos ambientais seriam de R$ 3,5 bilhões entre 2021 e 2040 chegando a R$ 5,5 bilhões se considerarmos até 2055. Isso indica que, se o estado do Acre cumprir as metas do novo marco no prazo estabelecido, uma parte expressiva dos frutos da universalização (63%) já seria colhida nas próximas duas décadas.
Édison Carlos, presidente do Instituto Trata Brasil, chama a atenção para o momento fundamental que passa o Acre e para a responsabilidade das autoridades locais: ?O novo marco legal do saneamento trouxe desafios, mas também grandes oportunidades, e o Estado do Acre está entre os que mais ganhariam no país com acesso de todos à água potável e esgotamento. Mas tudo isso pode se perder se Prefeitos e Governadores não se unirem em torno de um projeto regional que atenda a todo o estado.?
Análise da série histórica de 2005 a 2019
Tabela – Custos e benefícios da expansão do saneamento no Acre, 2005 a 2019
Estimativas: Ex Ante Consultoria Econômica. (*) em valores presentes a preços de 2019.
(**) dos investimentos e das operações de saneamento e das atividades imobiliárias.
Os avanços em saneamento básico no Acre, período de 2005 a 2019, foram pequenos, mesmo assim trouxeram benefícios econômicos que alcançaram R$ 1,2 bilhão, sendo R$ 636 milhões de benefícios diretos (renda gerada pelo investimento e pelas atividades de saneamento e impostos sobre consumo e produção recolhidos) e R$ 655 milhões devido à redução de perdas associadas às externalidades. Assim, os benefícios excederam os custos em R$ 784 milhões, indicando balanço social positivo para as 22 cidades do Acre.
Evolução dos Indicadores de Saneamento Básico entre 2005 e 2019
De 2005 a 2019, os indicadores de acesso à água potável e esgotamento sanitário aumentaram, mas pouco para tirar o estado do atraso histórico. No acesso à água passou de 33,2% da população atendida em 2005 para 48% em 2019. No esgotamento sanitário os avanços foram insignificantes, saindo de 8,8% da população com coleta dos esgotos em 2005 para 10% em 2019.
Rio Branco: ao analisar as 10 maiores cidades do Acre, no entanto, tem-se uma ideia melhor dos desafios, pois apenas Rio Branco informa ao SNIS seus dados de população atendida com coleta dos esgotos. Dos quase 410 mil moradores da capital, somente 88,1 mil possuem coleta dos esgotos, ou seja, 78,3% dos moradores da capital não têm acesso ao básico, o que justifica a constante posição do município entre as piores cidades do Ranking do Saneamento.
Tabela ? Indicadores de Saneamento Básico dos 10 maiores municípios do Estado do Acre
Fonte: SNIS 2019
O PERFIL DOS MAIS ATINGIDOS SEM ACESSO AO SANEAMENTO
O estudo também levantou de forma inédita o perfil da população sem acesso aos serviços básicos de saneamento no estado. Os dados indicam que, em 2019, a privação de saneamento estava fortemente concentrada na população jovem, autodeclarada parda e mais pobre do estado. Se, de um lado, o perfil da privação dá uma coloração fortemente social dos déficits de saneamento no Acre, de outro, a universalização do saneamento traz consigo a inclusão social.
Distribuição do déficit de saneamento, por faixa de rendimento per capita, Acre, 2019
Fonte: IBGE. Elaboração: Ex Ante Consultoria Econômica.