Em estudo publicado em fevereiro pelo Instituto Trata Brasil em parceria com a Associação Brasileira de Agências de Regulação (ABAR), instituição que congrega os principais entes reguladores do Brasil, foram coletados dados de uma pesquisa feita com 66 agências reguladoras de saneamento pelo país. O estudo aborda o cenário com a nova Lei do Saneamento (14.026/2020), no qual as agências reguladoras serão cada vez mais exigidas em relação a fiscalização e cumprimento das metas. Vale lembrar que mais de duas mil cidades brasileiras ainda não têm os serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário regulados.
Dentre várias percepções captadas, a pesquisa avalia dirigentes e técnicos das agências reguladoras sobre os desafios trazidos com as novas atribuições às agências e à Agência Nacional das Águas e Saneamento Básico (ANA), responsável pela formulação das normas de referência para toda a regulação dos serviços a partir da aprovação do novo Marco Legal do Saneamento. A metodologia do estudo pode ser acessada no relatório completo nos sites teste.tratabrasil.org.br e www.abar.org.br.
São vários os desafios a serem vencidos com a nova Lei Federal, sobretudo em relação à regulação dos serviços, pilar essencial para garantir segurança aos investimentos necessários para que, em 2033, 99% da população tenha água tratada e 90% tenham seus esgotos coletados e tratados.
Regulação do saneamento básico e Desafios com a nova Lei ? O titular dos serviços públicos de saneamento básico deve definir a entidade responsável pela regulação e fiscalização desses serviços, independentemente da modalidade de sua prestação. Diferentemente das outras infraestruturas que possuem uma única agência reguladora federal, no caso do saneamento são várias agências infranacionais. Na prática, cada município tem o poder de escolher sua agência, o que criou um cenário múltiplo. Temos agências reguladoras municipais, estaduais e consorciadas. Essas agências têm como objetivos principais:
a) Definir tarifas que assegurem tanto o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos quanto a modicidade tarifária;
b) Garantir o cumprimento das condições e metas estabelecidas nos contratos de prestação de serviços e nos planos de saneamento;
c) Estabelecer padrões e normas para a adequada prestação e a expansão da qualidade dos serviços e para a satisfação dos usuários.
Considerando que o Marco Regulatório traz novos desafios para as agências reguladoras, notadamente em relação ao conjunto de normas de referência (cerca de 22 normativos, conforme minuta de Agenda Regulatória da ANA para o biênio 2021-2022), é muito importante que elas tenham os instrumentos básicos de trabalho (recursos humanos e materiais), capacitação dos técnicos, independência e autonomia financeira para assumir tamanha responsabilidade.
Confira abaixo um dos principais resultados da pesquisa:
Pergunta: Avalie alguns desafios para a sua Agência: a. Interferência política; b. Autonomia financeira; c. Autonomia administrativa; d. Quadro de pessoal; e. Corpo gerencial e diretivo
As agências reguladoras de saneamento básico enfrentam diferentes desafios, desde a sustentabilidade financeira, autonomia administrativa, quadro de pessoal como também em relação ao quadro gerencial e diretivo. No estudo, se considerarmos a percepção dos reguladores apenas no item ?Extremamente Relevante?, vemos que os grandes desafios serão no Quadro de Pessoal (51% das respostas), Autonomia Financeira (45%) e na Autonomia Administrativa (41%). Importante notar também que a Interferência Política foi citada por mais de 1/3 dos Reguladores. Também os dirigentes elencam os mesmos quesitos, porém em menor proporção como ?Extremamente Relevante?.
Com relação ao desafio para o Quadro de Pessoal (51% das respostas de reguladores e 48% dos dirigentes), ressalta-se que mais da metade dos servidores das agências participantes não é concursada, o que é visto como principal motivo da rotatividade, tornando a transferência e retenção do conhecimento de regulação mais difícil com consequente impacto na continuidade normal das atividades regulatórias.
Destaque para a relevância que o item ?Interferência Política? teve. Se juntarmos as denominações ?extremamente relevante + muito relevante + relevante?, chegamos a 79% das respostas para reguladores e 69% para dirigentes. Nesse aspecto, Édison Carlos, presidente executivo do Instituto Trata Brasil, diz: ?As agências precisam trabalhar livres de interferências políticas, pois é um trabalho técnico e muito especializado. Interferências deste tipo comprometem a finalidade e aumentam a percepção de risco ao investidor afugentando investimentos essenciais para universalização?.